Se escrevesse com a mão na tua mão

Se escrevesse com a mão na tua mão
poderia iniciar uma fábula verdadeira
na linha dupla das palavras contrárias e fraternas
como quem entra no espaço do aroma
dessa concha espessa e branca
incrustada nas virilhas redondas do tempo
Seria o encontro de duas sombras de dois veios de luz
sobre o ramo de um enigma
que reunisse o que existe e o que não existe
sob o pudor cintilante de um silêncio de estrelas
Com palpos novos tocariamos o veludo
da transparência A nossa casa seria uma morada branca
vagarosamente limpa entre os anéis da sombra
Nela repousariamos como num ninho forte
ou dentro do braço côncavo de uma torre horizontal
Na encruzilhada das ancas uma cálida serpente
oferecer-nos-ia o gérmen verde do encontro
Dormiríamos com o sabor do pão e da terra do mar e das árvores
enquanto uma aranha paciente teceria a franja do olvido
O mundo seria o nosso mundo como um grande pássaro de terra
cujos ovos vermelhos contivessem o sal do tempo
o leite azul do vento e um diamante de argila
Iríamos até ao fundo de um mar de pedra estilhaçada
colher os frutos do intacto com os seus olhos de sombra sob delicadas vespas

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